O Poema
Texto da Ana Benavente, publicado no Facebook
Para aquele deputado branco de raça caucasiana, racista e ignorante, abominável, uma foto e um poema.
Na foto o meu Pai e eu. Moreno, nariz adunco, cabelo ondulado, mouro, mouro, português. Quando cheguei à Suiça em 1965 perguntavam-me se era cigana ou se era iraniana eu, portuguesa, cidadã do mundo.
E o poema de Luis Filipe Sarmento.
O POEMA:
Se digo mãe, digo Itália; se digo avó, digo ilha,
se digo bisavô, digo Galiza; se digo trisavó, digo França
um tetravô na Grécia outro em Damasco;
um perdido na Índia cigana outra nas ruas da Palestina,
se chegar aos décimos avós sou de todos os lugares,
venho de todas as origens, concebido em todas as religiões;
venho de um pirata e seguramente de uma puta,
de um marajá e de uma cortesã, uma geisha
e um traficante de sedas; uma amazona das estepes
e um boiardo; um vizir e uma poeta,
família de assaltantes nos idos dos avós doze,
marinheiros das austrálias, perdidos nos infernos
de ser gente do mundo e no mundo parental
chego depois de várias incidências
a esta Lisboa remodelada; na Mouraria um primo
outro no Quartier, uma prima no Magrebe
outra em Moscovo e mais uma no Congo
e milhares no Brasil, o meu ADN é o mundo,
as minhas células do universo
sou um homem feito de mulheres em verso.
Nas minhas veias há um refugiado profundo
Afinal onde está o meu berço?
[LUÍS FILIPE SARMENTO, in 'Casa dos Mundos Irrepetíveis', 2015]
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