NOVO ANO 2022
Entramos em 2022, com toda a esperança do mundo!
LUGAR DO SOL
Há lugar na mesa onde a luz
abdicou do seu ofício.
Já foi do sol
e do trigo esse lugar - agora
por mais que escutes, não voltarás
a ouvir a voz de quem,
há muitos anos, era a delicadeza
da terra a falar: " Não comes a maçã?"
Também já não há quem se debruce
na janela para sentir
o corpo atravessado pela manhã.
Talvez só um outro verso
consiga juntar no seu ritmo
luz, voz, maçã.
LUZ RECENTE
Respiras com cautela a luz
recente.
Deve ter acordado: canta.
Anos e anos adormecida
no fundo da pupila.
Já nem te lembravas
que fora assim tão jovem
e tinha
o nome da alegria.
Agora canta. Canta
em surdina.
NA LUZ A PRUMO
Se as mãos pudessem (as tuas,
as minhas) rasgar o nevoeiro,
entrar na luz a prumo.
Se a voz viesse. Não uma qualquer:
a tua, e na manhã voasse.
E de júbilo cantasse.
Com as tuas mãos , e as minhas,
pudesse entrar no azul, qualquer
azul: o do mar,
o do céu, o da rasteirinha canção
de água corrente. E com elas subisse.
(a ave, as mãos, a voz.)
E fosse chama. Quase.
Poesia * Eugénio de Andrade
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